terça-feira, 1 de janeiro de 2008

Sonho do livro e o falso despertar

Este sonho aconteceu recentemente, na madrugada do dia 29/12/2007. Ao final da descrição do sonho, relaciono algumas das condições que, parecem-me, podem ter sido relevantes para a lucidez.
Estava com meu pai ouvindo algumas músicas antigas em discos de vinil. Lembro-me que queria "baixá-las" pela Internet. Por alguma razão que não me lembro bem, resolvi ir comprar esses mesmos discos. Fui a uma rua, no centro de S.Paulo, uma avenida que, obviamente, estava totalmente diferente, muito mais bonita, com altíssimos edifícios de vidro, de diversas cores, em ambos os lados.
No meio, havia um canteiro central, por onde eu andava. Ao final da avenida, podia se ver uma estação de metrô, de onde saíam muitas pessoas. A certa altura, a quantidade de pessoas que saíam da estação aumentou muito, como uma espécie de "dilúvio" humano. Resolvi então dar as costas para a multidão e voltar rapidamente, fugindo do fluxo.
Conforme tentava correr, não conseguia, meus pés não me obedeciam, parecia que a imagem deles tremia enquanto tentava focalizá-los, ao mesmo tempo em que me encontrava confuso com a situação.
Foi neste momento que percebi que estava sonhando !
Resolvi então voar para o alto, podendo então observar claramente os imensos edifícios, espécies de caixas de vidro transparentes, coloridas, com a avenida embaixo.
Enquanto retinha a idéia de que era um sonho, pensei: tenho que aproveitar e fazer algo realmente significativo !
Pensei então: tenho que encontrar um Mestre ! Um Mestre!!
Não me lembro se foi um pouco antes disso ou um pouco depois (seria significativo esclarecer isso...), notei que estava preso em uma das caixas de vidro, como se estivesse em um dos prédios enquanto voava. Porém, como sabia que era um sonho, resolvi atravessar essa parede de vidro, o que aconteceu sem qualquer dificuldade.
Ainda com a idéia do Mestre na cabeça, e enquanto voava, percebi que à minha frente haviao uma espécie de elevação de terra, uma espécie de ilha ou penhasco, ou uma chapada, bem no meio da avenida, de modo a formar uma espécie de "tabuleiro" ou "mesa" no alto, um pouco abaixo de onde me encontrava voando. Resolvi voar até ali, e percebi que havia vários objetos, dentre os quais um livro grande, com letras em outra língua, creio que em latim.
Ao examinar melhor esse livro percebi que na contra-capa havia um espaço, onde alguns papéis se encontravam enfiados. Ao abrir a contra-capa, creio que "entrei" nela, de modo que pude ver que vários papéis e objetos se encontravam ali. Parecia que estava penetrando em algo importante, talvez em mim mesmo, ou algo assim... Foi então que acordei !
Isto é, hove UM FALSO DESPERTAR !
Pois ao acordar, encontrei minha irmã e contei para ela esse sonho, dizendo que havia tido um sonho "bem louco" (ou seja, o sonho acima). Porém, na verdade, ainda estava sonhando. Creio que esse falso despertar foi um artifício criado pela mente para enganar a lucidez e me devolver ao estado onírico ordinário. E assim, passei o resto da noite sonhando, após contar o sonho e descrevê-lo em detalhes, como se acordado estivesse.

É importante notar que:

- antes de acontecer esse sonho, havia descançado bastante, tendo dormido também à tarde. Creio que ir dormir já descançado ajuda a armazenar energia, mas isso é uma hipótese.

- estava bem relaxado e em um lugar calmo, um sítio no meio da natureza, de modo que o sono era bem tranquilo;

- como sempre, havia meditado um pouco antes de dormir, exercitando a consciência no período intermediário entre a vigília e o sono propriamente dito. Porém, o sonho lúcido acima descrito não aconteceu logo após esse período, mas bem no final da noite. Aqui, torna-se importante observar que no meio dessa meditação, surgiu a idéia de que o sonho lúcido somente seria possível se o consciente entrasse em um acordo com a vontade inconsciente; ou seja, uma espécie de convívio respeitoso, por meio do qual o inconsciente "permite" a lucidez onírica desde que o Ego onírico (consciente) não interferisse com o "contexto" onírico (ou seja, não questionasse a realidade onírica em si mesma, mas tão somente interagisse com tal contexto, como um "outro" real).

10 comentários:

Richard Hermeticum disse...

Jholland, (já te deves ter apercebido que estou a ler os posts mais antigos), a ultima parte deste post fez-me ter necessidade de perguntar-te uma coisa.
Como já disse algures no teu blog, até hoje só tive um sonho lúcido. Alias, a primeira vez que ouvi falar de sonhos lúcidos foi há pouquissimo tempo, aqui no teu blog.
Acontece que o meu primeiro sonho lúcido, relatado no teu post mais recente, foi espetacular, mas manipulei-o ao máximo. Não só voei, como criei espirais, mudei de cenários, etc.
Será por isso que nunca mais consegui ter sonhos lúcidos, mesmo cada vez esforçando-me mais?

jholland disse...

Sinceramente, não creio.

O fato de voce ter ouvido falar há poquíssimo tempo de sonhos lúcidos e, em pouco tempo, já ter tido um sonho em que consegiu manipulá-lo com proficiência, revela seu enorme talento, lucidez e energia. Não subestime a si próprio !

De qualquer forma, a questão não se faz no passado, mas sempre no presente. Não é pelo fato de voce ter manipulado o sonho (no passado) que voce bloqueia o acesso à lucidez onírica (no presente). Mas, NO PRESENTE E A CADA INSTANTE, é que o processo ocorre: se voce relaxar e tiver um convivência cordial com seu "inconsciente", durante o cotidiano presente, creio que isso facilitará a lucidez. No caso da postagem, a meditação ocorrida à noite pode ser traduzida como a prática desse relaxamento, cujos frutos transferem-se para o mundo onírico. No seu caso, penso que o hipotético bloqueio não se deu em razão da manipulação naquele sonho, mas, se de fato ocorre, é talvez porque a postura de dominação do consciente sonbre a instância inconsciente se propague no presente.

O relaxamento,penso, é o antídoto para isso.

Meu testemunho pessoal é de que, durante a maior parte da minha vida, não havia tido sonhos lúcidos. Estes começaram há cerca de 2 anos e meio, sem esforço, como produto de práticas meditativas e do contato com os ensinamentos budistas. Note-se bem: até então não sabia que o próprio budismo também falava desse assunto !
A questão que voce propôs continua um mistério para mim e é, na verdade a questão mais simples e ao mesmo tempo a mais crucial. Seu esclarecimento implica termos desvendado alguns dos mistérios mais recôndidos a respeito da mente e dos sonhos ! De fato, ando a procurar a solução definitiva para essas questões: como aumentar a lucidez, a frequência e a intensidade dos sonhos lúcidos ?
Algumas pessoas - aparentemente sem qualquer talento especial - têm sonhos lúcidos com enorme frequência. Outras, grandes praticantes de meditação e sinceros buscadores, nunca o tiveram.
É possível que a lucidez onírica seja um produto de nossa própria crença, no sentido budista, de que tudo é um sonho. Há pouco, li um livro sobre OBE em que o autor afirmava que no "mundo astral", tal como num sonho, nossas crenças e temores assumem formas concretas. Talvez essa seja a natureza da mente: a simples crença sincera, vivida e percebida, de que é possível, de que o mundo é apenas um sonho e de que não há diferenças entre a vigília e o sonho, facilite a lucidez onírica.
Tratar-se-ia de exercitarmos nossa flexibilidade mental cotidianamente.

Acrescento, por fim, o seguinte: no mês de Maio, último, tive muitos sonhos lúcidos, quase 1 sonho a cada dois dias. No mês de Junho, quase nenhum ! Percebi que a prática meditativa cotidiana, consistente em observarmos com muitíssima acuidade e atenção cada reação da mente a cada detalhe do cotidiano, associada a uma prática de despreendimento e liberdade desses condicionamentos sutis e constantes - aquilo que chamo de "meditação da presença", num grau muito intenso e relaxado - teve por consequência quase imediata a profusão de sonhos lúcidos. Talvez seja porque tal prática meditativa traga a convicção íntima de que somos livres...
E talvez também por isso as crianças têm mais facilidade em sonhar lucidamente !

jholland disse...

Sugiro ainda que vc dê uma lida em outra postagem:

http://sonhoslucidus.blogspot.com/2008/03/sonho-lcido-em-terceira-pessoa-e-falso.html

A interpretação dada ali tem tudo a ver com essa discussão !

Abraços

Lumenamena disse...

Olá jholland - Gostei muito de ler a sua informação.
A meditação é muito importante e ajuda e muito, na concretização de um sonho lúcido.
Eu medito duas vezes ao dia e os sonhos aparecem com muita facilidade, por vezes sem dar conta. Posso até manipulá-los, ou seja, mudar seu rumo.

Um Abraço,
Lumenamena

jholland disse...

Olá, Lumenamena,

Nem preciso dizer que concordo inteiramente com voce. Li seu comentário no Blog Pyr Hermética - muito impressionante. Especialmente o fato de que voce consegue esse profundo estado de lucidez praticamente à vontade. O simples fato de voce reconhecer a meditação econseguir ingressar na lucidez onpirica em profusão é uma indicação precisa e inequívoca de que sua meditação é poderosa e profunda. Penso que voce conseguiu abrir um Grande Portal secreto que te poderá levar a descobertas e auto-transformações infinitas. Luto muito para conseguir esse estágio e ingressar nesse grande tesouro. Sei que progrido, mas, claro, sempre queremos mais e mais...

Abraços !

Lumenamena disse...

Olá jholland - sim, o segredo é começar com o estado mental muito positivo e puro, que vem do auto-preenchimento, ou seja da auto-realização. Então a ideia, é usar essa energia para preencher todas as outras metas. É mesmo uma questão de energia. Devendar certos mistérios e resgatar segredos tráz liberdade ao ego, dito por muitos yoguis, desde a antiguidade, a expressão: intoxicação espiritual".
Sempre há novas descobertas, novas fronteiras, a serem exploradas. Alguns aspectos estão relacionados com o entendimento das leis naturais, como o karma e o dharma, e também com a visão de tempo, ou seja, a trajectória da alma.
Não é difícil atingir esse estádio, requer muita persistência, e assiduidade na prática da meditação.

Um Bem Haja,
Lumenamena

Richard Hermeticum disse...

Olá companheiros,
Vou voltar a insistir em duas questões específicas porque, para mim, são fundamentais.
Quando vocês se apercebem que estão a sonhar, entre muitas outras coisas, conseguem ouvir a vossa própria voz, correcto? Notam alguma diferença substancial na vossa própria voz?
Segunda questão: é assim tão complicado mudar drásticamente o cenário do sonho, ao ponto de, por exemplo, alterarem o cenário para uma época que já não existe na realidade?


Um abraço,
Richard

jholland disse...

Richard,

Acho que tudo é uma questão de grau de lucidez. Essa lucidez, é claro, vai progredindo com a prática e também com aquilo que poderíamos denominar, genericamente, como "estado presente" ou "estado na presença" (na vigília, no estado hipnagógico e no sonho).

No meu caso, confesso que ainda estou engatinhando, vacilante e claudicante, por esses Reinos do Agora.

Não me lembro bem de ter ou não ouvido minha voz, simplesmente não me chamou a atenção em especial. Reputo isso simplesmente ao fato de a lucidez não ter sido tão completa ou - o que dá mesma - minha atenção, ao despertar no sonho, tenha sido dirigida justamente a outros aspectos: o tato e a visão, em especial.

No Dzogchen recomenda-se que exercitemos toda a nossa imaginação, tanto no que diz respeito ao nosso corpo (transformar-nos em outros seres, em múltiplos, mudar de tamanho, de natureza etc), como também ao cenário onírico (incluindo aí, creio, o tempo "histórico", como voce mencionou). (Observo que o cenário do Sonhos Lúcido não, a princípio, o mesmo da Projeção Astral.)

Descobri que certas coisas são um pouco mais difíceis que outras, talvez porque exijam um desapego maior. Por exemplo, a mudança de identidade. Nada, entretanto, que não possa ser superado pela prática. De fato, o sonho lúcido é também, ele próprio, uma espécie de meditação, exige prática, concentração e relaxamento.

Gostaria de saber por que a questão da voz é tão importante ? Tem algum significado especial ?

Abraços !

Lumenamena disse...

Para todos amigos,

Tenho estado em reflexão sobre todos os acontecimentos vividos de sonhos lúcidos.
Meus amigos, a pergunta que o Richard Hermeticum faz sobre a voz, tem o seu fundamento. Ele próprio diz no seu blog pyr-hermetica, que num sonho lúcido que teve, ouviu a sua voz mas diferente, ou seja, mais madura. Houve um reflexo do seu estado de consciência, a fim de realizar algo, que altera a sua voz. Essa sabedoria do seu eu interior, comunicou através da voz da sua intuição. Isto acontece, uma vez que também oiço a minha voz.
Basta alimentar a clareza da percepção consciente. Concentra-te simplesmente a intensificar o teu nível de sensação.

Abraços,
Lumenamena

jholland disse...

Lumenamena,

Excelente observação.

Mais uma vez, obrigado por seus esclarecimentos.

Muito interessante a associação entre a voz do sonho e a voz interior...

Já havia experimentado uma espécie de escrutínio do meu Eu olhando-me em um espelho onírico, mas nunca tinha prestado atenção à voz.

Vou experimentar isso !